A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou inválida norma coletiva que flexibilizava o descanso semanal de trabalhadores fluviários da Chibatão Navegação e Comércio Ltda., de Manaus (AM), que operam embarcações entre Manaus, Porto Velho e Belém.
Entre outras medidas, as folgas deverão ser concedidas ao fim de cada viagem, na proporção mínima de um dia de descanso para cada dia de trabalho embarcado. A empresa de navegação também foi condenada a pagar R$ 300 mil por dano moral coletivo e multa caso descumpra as determinações.
Jornadas exaustivas
Na ação civil pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) disse que a Chibatão exigia de seus trabalhadores jornadas de trabalho exaustivas sem folga semanal. Segundo denúncia recebida, alguns deles só tinham direito a um dia de descanso após 30 dias ininterruptos de trabalho.
Maior do estado
O MPT ressaltou que a Chibatão é a maior empresa de navegação do Amazonas e tem cerca de 146 embarcações (100 balsas e 46 empurradores) que atuam no transporte interestadual de cargas que chegam a Manaus, empregando mais de 1.300 empregados, dos quais quase 300 são fluviários.
Mesmo assim, não tem equipes de folgas, o que inviabiliza a elaboração de uma escala de revezamento. “É preciso que a empresa contrate mais trabalhadores e elabore um sistema de folga adequado, tendo em conta principalmente a duração das viagens”, defendeu o MPT.
Normas coletivas
Em sua defesa, a Chibatão alegou que cumpria a convenção coletiva de trabalho que previa folgas aos embarcados na proporção de 25 dias trabalhados para cinco de descanso. Além disso, o acordo coletivo também estabelecia que, a cada 75 dias embarcados, os fluviários teriam direito a 15 dias de folga no porto da cidade de contratação. Ainda segundo a empresa, não há previsão legal de dois dias de folga para cada dia de trabalho, e a mão de obra é escassa.
Peculiaridades
O juízo de primeiro grau deferiu todos os pedidos do MPT, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR) reformou a sentença, inclusive retirando a condenação por dano moral coletivo. Para o TRT, as normas coletivas eram válidas e, diante da peculiaridade da atividade econômica da empregadora, compatibilizavam direitos sociais com a livre iniciativa.
Escalas de revezamento
No entanto, o TRT ressalvou que a empresa não organizava equipes de revezamento nem observava as escalas de trabalho e as folgas previstas nas normas coletivas. A escassez de mão de obra, segundo a decisão, não era justificativa para o descumprimento das normas, pois o risco do negócio é do empregador e não havia prova de que a empresa esgotou as possibilidades de recrutamento de trabalhadores no mercado de trabalho.
Manteve, então, a obrigação de organizar equipes de revezamento para as folgas das equipes que realizaram viagens, sob pena de multa por descumprimento.
Inadmissível
No recurso de revista, o MPT questionou a conclusão do TRT de que as especificidades do trabalho justificariam a flexibilização e sustentou ser inadmissível que o fluviário trabalhe por 75 dias antes que tenha direito a folga, mesmo que as viagens durem em média de 11 a 15 dias.
Direito previsto na Constituição
De acordo com a ministra Maria Helena Mallmann, relatora do recurso, o caso não se enquadra no entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a validade das normas coletivas (Tema 1.046 de repercussão geral), porque trata da flexibilização de direito previsto expressamente na Constituição Federal (artigo 7º, inciso XV) e, portanto, não pode ser negociado.
Regime especial
A ministra explicou que os trabalhadores marítimos têm regime especial de duração do trabalho, conforme artigos 248 a 252 da CLT, e a proporção mínima para folgas é de 1×1, ou seja, um dia de trabalho para um dia de descanso. Esse parâmetro não foi observado nas normas coletivas.
Risco à coletividade
A Segunda Turma do TST também restabeleceu a condenação por dano moral coletivo, acolhendo o argumento do MPT de que a jornada de trabalho exaustiva era um risco para toda a coletividade que utiliza o modo de transporte fluviário. Além disso, a relatora destacou que o descumprimento de normas de saúde e segurança dos trabalhadores é uma conduta antijurídica passível de reparação.
A decisão foi unânime.
Por: Lourdes Tavares/CF
Fonte: TST