Como nasceu o mito de que as baterias viciam, na década de 1960 (e por que você não deve se preocupar)
Você já ouviu falar do efeito memória: ele acontece quando você recarrega seu celular, notebook ou tablet antes da carga terminar e a bateria acaba perdendo capacidade, já que a parte não utilizada se torna preguiçosa e depois se recusa a trabalhar novamente.
Há algumas recomendações para cuidar da bateria, como dar uma carga inicial de 6, 8, 12 ou 24 horas (o tempo necessário depende da posição das estrelas no céu) e nunca colocar o eletrônico na tomada antes que a bateria zere, para não viciá-la, porque, assim como os humanos, elas precisam se exercitar regularmente.
Só que é tudo mito.
Na década de 1960, alguns satélites em órbita eram equipados com computadores que funcionavam com baterias de níquel-cádmio (NiCd). As baterias sempre chegavam a 25% de carga e depois eram elevadas novamente a 100%. Depois de muito tempo repetindo esse processo, os cientistas da General Electric (GE) notaram que os 25% não utilizados da bateria sofreram uma perda substancial de capacidade.
Foi a partir dessa única história que todo mundo, nas últimas décadas, passou a disseminar o mito de que as baterias viciam, e que você deve recarregá-las apenas quando a carga terminar. Na verdade, a própria GE não conseguiu encontrar nenhum outro caso de efeito memória em aplicações que não a do satélite — e isso nas baterias de NiCd, que eram bem menos avançadas que as utilizadas atualmente, de íons de lítio.
O que as pessoas não espalharam junto com esse mito foi que o efeito memória, além de ser totalmente reversível, só ocorreria caso você descarregasse e recarregasse a bateria na mesma capacidade, todos os dias, durante alguns anos. Em outras palavras, era quase impossível que isso acontecesse com seu celular ou qualquer outro eletrônico pessoal, já que você dificilmente recarregaria a bateria sempre no mesmo ponto.
Conclusão: a sua bateria não vicia, não sofre de efeito memória e pode ser recarregada a qualquer momento (na verdade, é até bom que você faça isso).
“Mas Higa, eu notei que a bateria do meu smartphone não está durando como quando ele era novo”. Não é apenas uma impressão sua: as baterias realmente vão perdendo capacidade com o tempo (e as antigas eram mais sensíveis a esse problema). Isso acontece devido a mudanças químicas nos eletrodos, inclusive na bateria de li-ion, presente no seu celular, tablet, notebook e quase todos os outros eletrônicos que você comprou nos últimos 10 anos.
À medida que a bateria é usada, os íons de lítio reagem com o óxido de níquel. Isso gera nanocristais de sal, que alteram a estrutura interna da bateria e fazem com que os íons se movam de maneira menos eficiente. Não há nada que você possa fazer para evitar a formação dessas pragas.
“Mas e os ciclos da bateria, Higa? A fabricante do meu notebook diz que a bateria dura 1.000 ciclos. Se eu recarregá-lo antes da carga acabar, vou estar desperdiçando ciclos”. Há muita confusão sobre o termo “ciclo”. Na verdade, um “ciclo” é contado apenas quando você descarrega 100% da bateria (e não cada vez que você coloca ou tira o aparelho da tomada). Este gráfico da Apple deixa isso claro:
Obviamente, isso não significa que você deva cuidar das suas baterias de qualquer jeito. Siga estas duas recomendações:
- Não submeta a bateria a temperaturas extremas. O calor ou frio excessivo interfere nas reações químicas e diminui a duração da bateria.
- Caso não use a bateria por um período longo, armazene-a com a carga em torno de 40%. Todas as baterias descarregam com o tempo. No caso da bateria li-ion, se a carga chegar a zero, não será possível recarregá-la novamente, por isso não é uma boa ideia guardá-la com a carga muito baixa. Por outro lado, se você armazenar a bateria completamente cheia, ela perderá ainda mais carga com o tempo.
De resto, viva despreocupado e seja uma pessoa mais feliz!